Rodrigue Tremblay: autor de próximo livro intitulase
"The Code for Global Ethics"
6.
November
10, 2016
Terremoto político: A revolução de Trump
nos Estados Unidos
Os trabalhos
de Hércules que esperam o novo Presidente
“Quando você dá [dinheiro aos políticos], eles fazem tudo
o que você quiser que eles façam. Como homem de negócios convém-me que seja
assim.” Donald J. Trump (1946-), em entrevista
ao Wall Street Journal, 29 de julho de 2015.
“Nós [os Estados Unidos] gastámos 2 biliões de dólares;
milhares de vidas. … Obviamente, foi um erro…George W. Bush cometeu um erro.
Podemos cometer erros. Mas aquilo era uma evidência. Nós nunca deveríamos ter
estado no Iraque. Nós desestabilizámos o Médio Oriente… – Eles [o presidente
George W. Bush e o vice-presidente Dick Cheney] mentiram… Disseram que havia
armas de destruição maciça. Não havia nada. E eles sabiam que não havia nada. Não
havia armas de destruição em maciça. ” Donald J. Trump
(1946-), durante um debate para a nomeação do candidato às eleições
presidenciais pelo Partido Republicano (GOP), na CBS News, sábado, 13 de
fevereiro de 2016.
“Na minha opinião, gastámos 4 biliões de dólares tentando
derrubar várias pessoas que, francamente, se se tivessem mantido, e se
tivéssemos gastado os 4 biliões nos Estados Unidos para consertar as nossas
estradas, as nossas pontes e todos os outros problemas; os nossos aeroportos e
todos os outros problemas que tivemos, teríamos feito muito melhor. Eu posso
dizer isso agora.
- Nós
causámos um tremendo dano, não só ao Médio Oriente; causámos um enorme dano à
humanidade.
As pessoas
que foram mortas, as pessoas que foram eliminadas, e para quê? Não parece que
tenhamos tido qualquer vitória.
É uma
bagunça. O Médio Oriente está totalmente desestabilizado. – Uma bagunça total e
completa.
-
Gostaria que
tivéssemos os 4 biliões ou os 5 biliões de dólares. Gostaria que tivessem sido
gastos aqui nos Estados Unidos, nas nossas escolas, hospitais, estradas,aeroportos e tudo o mais que se está a
desfazer”. Donald J. Trump
(1946-) num debate presidencial do Partido Republicano, terça-feira. 15 de
dezembro de 2015, Las Vegas, NV.
-
“Ao longo da história, qualquer profunda mudança política
e social foi precedida por uma revolução filosófica, pelo menos entre uma parte
significativa da população.” M. N. Roy (1887-1954), em “O Futuro da
Democracia”, 1950.
Ocorreu um terramoto
político geracional nos Estados Unidos e os choques que se irão
seguir são potencialmente enormes. Na verdade, em 8 de novembro de 2016, contra
todas as probabilidades, o candidato republicano Donald Trump (1946-) foi
eleito como o 45º presidente americano, repetindo ad nauseam o seu slogan
principal “Make America Great Again”. Será o primeiro presidente americano
desde Dwight D. Eisenhower (1890-1969) a ocupar a Casa Branca sem ter qualquer
experiência política.
A
retórica e as propostas de Trump foram
inequivocamente anti-establishment e anti status quo, tanto a nível nacional
como internacional. Como tal, a vitória de Trump é uma revolução política
na sua génese porque anuncia uma rutura com as políticas americanas seguidas
por ambas as administrações republicanas e democratas dos E.U.A. desde os anos
90.
Por isso, a eleição de Trump inspira tanto medo
quanto esperança. Medo entre as
elites estabelecidas, especialmente entre os meios de comunicação e interesses
financeiros estabelecidos e dominantes em Washington, já que a vitória de Trump
será, sem dúvida, vista como um repúdio dos valores e das políticas desses
interesses. E porque, depois do Brexit, em junho passado, pode ser também uma
antecipação de derrocada das elites europeias, que também impulsionaram ativamente
um mundo globalizado, com fronteiras abertas, imigração ilegal, mudanças
tecnológicas e desindustrialização das economias mais avançadas.
Dados da noite de eleição, 8 de
novembro, 22h
No
entanto, há esperança entre aqueles que foram deixados
para trás económica, politica e socialmente, especialmente entre os membros da classe média americana cujos rendimentos reais
estão estagnados ou em declínio e que sofreram muito com a agenda e as
políticas perseguidas durante as últimas três décadas. Nos últimos 30 anos, de
fato, os 10% mais ricos e os 1% super-ricos da população dos Estados Unidos
beneficiaram altamente com a mudança de uma economia de manufatura para uma economia
de serviços, enquanto os 90% mais pobres foram deixados para trás.
Muitos
dos trabalhadores americanos mais desprotegidos,
especialmente aqueles com formação abaixo do ensino secundário, viram no
candidato republicano Donald Trump e no candidato democrata derrotado Bernie
Sanders a esperança de ver as coisas mudarem para melhor. É sintomático que os
americanos nas grandes áreas urbanas tenham votado massivamente na candidata
democrata, enquanto as áreas industriais e rurais o tenham feito massivamente
no candidato republicano. Contrariamente às sondagens, os modelos de previsão
que incluíam o contexto histórico e o desejo de mudança na sua previsão tinham
razão. É o caso do modelo do professor universitário americano Allan J. Lichtman.
Os trabalhos de Hércules que esperam o novo
Presidente
O
presidente eleito Donald Trump e sua equipa têm pela frente uma tarefa
hercúlea, se quiserem cumprir as promessas que fizeram.
1- Comecemos com as principais mudanças que
se esperam na política externa.
Os
maiores perdedores das eleições de 8 de novembro serão os falcões da política
externa e os neoconservadores dos governos anteriores dos
Estados Unidos, desde o governo Bill Clinton até aos últimos governos de Obama.
Foram eles que levaram avante o reacender da Guerra Fria com a Rússia e que
desenharam as políticas intervencionistas, que estão a destruir o Médio
Oriente.
Espera-se
que uma administração Trump reverta a política da NATO liderada pelos EUA para
provocar a Rússia, multiplicando movimentos militares hostis nas suas
fronteiras. Além disso, pode-se esperar que uma administração Trump chegue a um
acordo com o governo russo de Vladimir Putin para pôr fim ao desastroso conflito
sírio. Esta é uma má notícia para a organização medieval e assassina do ISIS.
Naturalmente,
espera-se que um governo Trump possa transformar as diretrizes da política
comercial dos EUA. A política comercial deverá ser provavelmente acompanhada
por uma política industrial. Na prática, isso pode implicar que o curso dos
dois grandes tratados multilaterais de comércio livre e de investimento livre,
o Acordo de Livre Comércio Transatlântico (TAFTA) e o Acordo de Parceria
Transpacífico (TPP) será interrompido.
Nesse
sentido, a revolução Trump pode significar que a globalização económica e financeira está
morta.
2- As principais alterações que se podem
esperar de uma administração Trump na política interna.
Uma
administração Trump tentará estimular a economia dos EUA através de uma série
de políticas económicas. Afinal, o candidato Trump prometeu impulsionar a taxa
de crescimento dos EUA para um valor médio anual de 3,5% e criar 25 milhões de
postos de trabalho na próxima década. E também prometeu “rever as nossas
políticas fiscais, regulatórias, energéticas e comerciais”.
Como
pode uma administração Trump estimular o crescimento? Primeiro, propondo um
enorme corte de impostos de 4,4 biliões de dólares para estimular o
crescimento, não muito diferente do programa de corte de impostos de 1,3 biliões de dólares da
administração Bush-Cheney em 2001-2003, que teve resultados
duvidosos, além de ter aumentado o deficit fiscal do governo dos EUA.
Em
segundo lugar, um governo Trump tentará impulsionar a criação de empregos na
indústria dos EUA. Para isso, terá que fazer melhor do que o recorde alcançado
durante os dois mandatos de Bush-Cheney, quando os Estados Unidos perderam mais
de seis milhões de empregos na indústria. Para reverter essa tendência, Trump
pode tentar forçar o repatriamento dos lucros de 2,1 biliões de dólares que as
empresas americanas possuem no exterior e induzir essas empresas a investir
mais nos Estados Unidos. Pode também aumentar alguns impostos sobre as
importações para persuadir as empresas americanas a criar empregos nos EUA. Até
que ponto um Congresso controlado pelos republicanos aceitará essa política
comercial protecionista ainda está para se ver.
Finalmente,
o candidato Trump prometeu lançar um enorme programa de investimento em infraestruturas,
afirmando que queria “construir a próxima geração de estradas, pontes,
ferrovias, túneis, portos e aeroportos”.
3- Os desafios do governo Trump nas
políticas sociais
De
longe, o maior desafio que um governo Trump enfrentará será lidar com a
promessa do candidato Trump de abolir o programa nacional de saúde conhecido
como Obamacare. Ele propôs a substituição da lei americana de saúde com uma transferência
do Medicaid para os estados, acompanhada por um programa estadual de subsídios,
e isenção de impostos para as empresas que facultem planos de seguro de saúde
aos trabalhadores, sendo alargada a indivíduos que comprem os seus próprios
planos de saúde. O candidato Trump chegou mesmo a namorar a ideia de os EUA
adotarem um sistema de saúde de contribuição única. A ver vamos como uma
questão tão complexa irá ser resolvida.
Conclusão
Vai
levar semanas e meses até que a agenda real do governo Trump fique clara. Sob
uma presidência de Donald Trump, os Estados Unidos podem esperar mudar de
direção em muitas políticas. À medida que esta revolução se desenrolar, os
olhos do mundo estarão focados no governo Trump e nas novas políticas que ele
tentará implementar. Esperemos que tal seja feito com cuidado e pensamento
inteligente, e não de modo precipitado e caótico.
Rodrigue
Tremblay
___________________________________________________
Artigo
em inglês :
Political
Earthquake: The Trump Revolution in The United States, 9 de Novembre de 2016
Tradução : Júlio Manuel Dias Gomes
(Economics teacher at Faculty of Economics at University of Coimbra, Portugal,
now retired.)
5.
Estamos
em plena estagnação económica da geração “Baby-Boom” de 2007-2017
De acordo com as declarações governamentais, repetidas
irresponsavelmente pelos media do sistema, se hoje o mundo está mergulhado numa
crise profunda, amanhã já vêem sinais de recuperação para no dia seguinte
regressarem à crise mais profunda do que esperavam.
Rodrigue Tremblay, apesar de não pôr em causa o sistema
capitalista, diz-nos por que razões não se deve ter esperanças de uma
recuperação a médio prazo.
Rodrigue
Tremblay* - 23.07.09
«Os bancos são mais perigosos do que exércitos
permanentes»
Thomas Jefferson (1743-1826), III Presidente
dos EUA
«…uma grande recessão parece improvável;
[estamos à espera] que o sector financeiro recupere na próxima primavera e
melhore no Outono»
Sociedade Económica de Harvard, 10 de
Novembro, 1929
«Apesar do crash ter ocorrido há apenas seis
meses, estou convencido que já passámos o pior – e com uma contínua união de
esforços deveremos recuperar rapidamente. Não houve nenhuma falha significativa
na banca ou na indústria. Também esse problema está seguramente ultrapassado.»
Presidente Herbert Hoover, 1 de Maio de 1930
«Num sistema monetário assente no papel-moeda,
um determinado governo pode sempre originar consumo mais elevado e, a partir
daqui, inflação positiva»
Ben Bernanke, Presidente da Reserva Federal,
2002
Muitos observadores são da opinião de que a «prosperidade está
ali ao virar da esquina» e que esta recessão, como outras desde a II Guerra
Mundial, terminará logo que o mercado das acções, como indicador fundamental,
recupere e as pessoas comecem novamente a consumir. Esta é uma perspectiva míope
do panorama económico actual.
Na verdade, desde o auge da bolha imobiliária (nos EUA) em 2005,
a crise do subprime em Agosto de 2007 e o princípio da recessão em Dezembro de
2007, a economia dos EUA, e até um certo ponto, mundial, entrou num período de
prolongados reajustes. Claro que haverá períodos de crescimento económico no
futuro e poderá dizer-se, nos meses mais próximos, que a recessão oficialmente
terminou, mas a radical reorganização económica que está a ter lugar continuará
durante anos.
Por que razão isto é assim?
Essencialmente porque estamos no culminar de um ciclo de
Kondratieff de 60 anos de inflação-desinflação-deflação que começou em 1949,
quando os preços congelados pela guerra foram liberalizados; e esse poderoso
ciclo longo está agora a terminar. A era que se seguiu aos anos 1980, ou seja,
a era Reagan, acabou, mas os excessos e bolhas das últimas décadas têm que ser
corrigidos, num momento em que grandes mudanças têm lugar na população. Tais
ajustes levarão anos a desenvolver-se e isto implicará grandes esforços e
grandes mudanças.
Efectivamente, a era do excesso de consumo e do excesso de
dívida terminou. A era da excessiva desestruturação económica governamental e
da desregulação financeira terminou. A era dos esquemas financeiros
irresponsáveis à maneira de Charles Ponzi terminou. A era dos derivados não
regulados terminou. A era da ganância enquanto ideologia terminou. A era do
capitalismo selvagem e predatório terminou. A era do petróleo barato, do
transporte barato, dos bens baratos e da comida barata terminou. A era da
concentração excessiva de riqueza e rendimento também terminou. Todavia, a era
da corrupção política, dos políticos incompetentes e das guerras de agressão
destruidoras não terminou. O que começou foi a era da hiper-estagflação.
A principal força motriz por trás da maioria destes
desenvolvimentos, para além do colapso do sector financeiro, da pirâmide de
dívidas, da estrutura de produtos derivados e do discurso imponderado de
maiores guerras por parte de políticos irresponsáveis (como se não houvesse
problemas suficientes), será de natureza demográfica. Com efeito, entrámos num
período durante o qual o maior grupo demográfico da história da humanidade, a
geração «baby-boom» do pós-Segunda Guerra Mundial, ultrapassou o seu nível
máximo de consumo. Isto não é algo que possa ser invertido da noite para o dia.
Será um processo de reajuste que durará uma década, de menor gasto, de maior
poupança e, acima de tudo, do pagamento dos excessos de dívidas. Recordemos que
o consumo privado representa 70% do PIB.
As consequências económicas serão profundas e afectarão todos os
sectores da economia. Temos apenas que considerar o modo como a indústria
automóvel, em tempos um dos principais motores do crescimento económico, atravessa
neste momento uma reorganização fundamental e redução. Mesmo as indústrias
informatizadas em larga escala progrediram e já não podem ser consideradas
indústrias em rápido crescimento. Os únicos sectores de potencial crescimento
que restam nos EUA parecem ser a indústria dos serviços de saúde, dado o
envelhecimento da população, e as indústrias relacionadas com a guerra, uma vez
que o complexo industrial-militar norte-americano continua em expansão. Mas
mesmo estes sectores terão que abrandar, não vão eles levar toda a economia à
bancarrota.
É por isso que penso que estas tendências industriais e
demográficas anunciam um período de crescimento económico mais lento que poderá
durar muitos anos. É melhor que os governos despertem para os desafios colocados
por um crescimento económico tão lento. Muito poucas pessoas estão preparadas
para um período tão longo de estagnação económica, que será acompanhado por
liquidação de dívidas forçada, em ambiente de austeridade. Isto aplica-se
particularmente aos planos de reforma privados, que terão dificuldade em pagar
pensões nos próximos anos. Também se aplica ao emprego, que irá crescer a um
ritmo mais lento que a população activa, pelo menos durante algum tempo,
resultando numa subida da taxa de desemprego.
Os «baby-boomers» são os
indivíduos que nasceram entre 1946 e 1966. Por constituírem um vasto número
(mais de 70 milhões de pessoas nos EUA), esta geração tem dominado em todas as
esferas da vida nos últimos cinquenta anos. Mas agora ultrapassaram já o seu nível
máximo de consumo. Este ocorreu em 2005-2006, em pleno auge da bolha
imobiliária. A média etária daquele grupo demográfico era então 50 anos, que é
a idade de maior consumo. Nessa altura, a taxa de poupança privada nos EUA
desceu uns alarmantes 2,5% por ano. Como comparação, era 12,5% durante a
recessão de 1981-82, recuperou agora uns fenomenais 5,7% em Abril de 2009 e
está a subir rapidamente.
Com efeito, o fim da bolha imobiliária, a crise financeira e a
recessão económica em conjunto deram um sinal claro aos «baby-boomers». É
melhor que comecem a poupar rapidamente, ou a vossa reforma terá que ser
adiada. E poupar significa consumir menos e gastar menos dinheiro, enquanto se
saldam dívidas de modo a fazer subir os activos correntes a um nível que possa
suportar as necessidades da reforma. Mas se o maior grupo de consumidores
diminuir os seus gastos e empréstimos, o que é que isto significa para o
consumo agregado e para o crescimento económico? Apenas poderá significar menor
crescimento económico global e alguns penosos ajustes económicos. Por
conseguinte, há uma probabilidade elevada de que esta recessão seja uma
recessão enorme cujos efeitos poderão durar anos, interrompidos por curtos
períodos de recuperação rapidamente seguidos por um regresso das causas da
estagnação. No Japão, em meados dos anos 1990, uma recessão igualmente causada
por aspectos financeiros e demográficos durou uma década inteira. E mesmo
depois de 20 anos, não se pode dizer que o Japão tenha resolvido o problema.
A curto prazo, de modo a contrariar os efeitos da crise
financeira e combater a corrente recessão que começou oficialmente em Dezembro
de 2007 (de acordo com o National Bureau of Economic Research - NBER), a
administração Obama concebeu um plano de estímulo de 750 mil milhões de dólares
e deixou o deficit fiscal explodir para mais de 2 triliões de dólares por ano
devido ao bailout dos bancos em dificuldades. Do mesmo modo, a Reserva Federal
baixou as taxas de juro a curto prazo para zero e adquiriu milhares de milhões
de dólares em títulos do tesouro a longo prazo, em títulos de agências
governamentais, e mesmo em títulos garantidos por créditos hipotecários, numa
tentativa desesperada de salvar grandes instituições financeiras como a AIG, a
Fannie & Freddie e outras instituições financeiras norte-americanas da
implosão. Mas agora os investidores, especialmente os investidores
internacionais, estão a vender obrigações do Tesouro e a fazer subir as taxas
de juro a longo prazo e a fazer descer o dólar norte-americano à medida que o
medo da inflação aumenta, embora, paradoxalmente, o colapso da pirâmide de
dívidas crie um ambiente deflacionário para toda a economia.
O perigo neste caso é que os investidores irão vender as obrigações
do Tesouro mais rapidamente do que a Reserva Federal pode comprá-los, em cujo
caso os preços das obrigações descerão em espiral, à medida que a inflação e o
medo da falência são exacerbados. Numa palavra, se a Reserva Federal não tornar
mais flexível a sua política corrente de monetarização excessiva da dívida
pública e privada e a sua clara política de «negligência benigna» relativamente
ao dólar, a inflação elevada e até mesmo a hiper-inflação tornar-se-ão
possíveis neste processo. Isto já aconteceu no passado e não há razão para que
não volte a repetir-se, especialmente se os EUA continuarem a envolver-se em
guerras onerosas no estrangeiro, pagando estas aventuras com dinheiro que não
têm.
Por agora, um rápido ressurgimento da inflação é apenas uma
remota possibilidade. Mas esta é, não obstante, uma possibilidade, considerando
que os bancos centrais tendem a cunhar moeda fiduciária em excesso. De facto,
se os governos tentarem resolver o problema demográfico estrutural no horizonte
através da cunhagem de moeda, acabarão por gerar hiper-estagflação. Em poucas
palavras, é isto que o gigantesco mercado internacional de obrigações dominado
pelo dólar vê e receia, num momento em que tem que absorver uma enorme
quantidade de novas emissões de obrigações. Na verdade, o mercado de obrigações
ganhará sempre, face a qualquer banco central, em qualquer altura. Os problemas
da solvência e a provável incapacidade do Estado da Califórnia para pagar a sua
dívida fabulosa apenas aumentarão a ansiedade.
Há umas semanas atrás, alertei para o risco de futuros aumentos
súbitos das taxas de juro a longo prazo e desvalorização do dólar
norte-americano após as decisões por parte do Tesouro norte-americano e da
Reserva Federal de inundar os mercados com triliões de dólares de novas
emissões de obrigações do Tesouro e com dinheiro acabado de imprimir. Essa
tendência está a chegar mais rápido do que pensei. Só quando os mercados podem
esperar uma relativa estagnação económica e um ambiente deflacionário duradouro
é que as taxas de juro de longo prazo estabilizam.
Estejam bem preparados. Vem aí uma década económica muito
difícil.
_______________________________________________________________________
* Rodrigue Tremblay é Professor emérito de economia na
Universidade de Montreal Tradução: André Rodrigues P. Silva
4.
O
sistema financeiro dos EUA está em sérias perturbações
por Rodrigue Tremblay [*]
"…
uma salvação de possuidores de títulos de empresas patrocinadas pelo governo
(Fannie e Freddie) seria talvez o maior roubo dos contribuintes da história
americana. É má teoria económica e pode estar certo de que é uma política
terrível".
Matt
Kibbe, Presidente do Freedom Works
"A
primeira panaceia para um país mal administrado é a inflação da sua divisa, a
segunda é a guerra. Ambas trazem uma prosperidade temporária, ambas trazem uma
ruína permanente. Mas ambas são o refúgio de oportunistas políticos e
económicos".
Ernest
Hemingway (1899-1961), (Setembro/1932)
[Após
a salvação do Bear Stearns] "Quando mais firmas perdem acesso ao financiamento, o círculo
vicioso da venda forçosa, da volatilidade acrescida, ... e as margin calls [1] que já estavam bem avançadas naquele
momento provavelmente seriam intensificadas. A economia mais ampla dificilmente
poderia ter permanecido imune a tais severas rupturas financeiras".
Ben
Bernanke, Presidente do Fed (Março/2008)
Em Agosto de 2007, no princípio mesmo da crise financeira das subprime
nos EUA, e referindo-me à prática semelhante à alquimia de criar instrumentos
financeiros artificiais, tais como as mortgage-backed securities (MBSs), eis o
que escrevi :
“Tal
como todos os 'esquemas de Ponzi' , tais
pirâmides de dívidas sem activos líquidos por trás estão destinadas a implodir
mais cedo ou mais tarde". Também escrevi acerca da intervenção do Fed
nesses casos, que "alivia a 'crise de liquidez', certamente, mas nada faz
para curar a 'crise de solvência' de instituições que possuem grandes porções
de activos apoiados por hipotecas não cumpridas. Mais cedo ou mais tarde, tais
derivativos de baixo valor terão de ser cancelados, e isto necessariamente
levará a uma erosão do capital base destas instituições. Bancarrotas das
instituições mais alavancas e imprudentes são aguardadas.”
De
facto, bancarrotas de tais instituições financeiras super-alavancadas
tornaram-se inevitáveis. Durante algum tempo, fusões forçadas entre bancos,
iniciadas pelo Fed ou pelo Tesouro, podem suavizar a explosão. Mas depois desse
período, as bancarrotas claras e sem rodeios não poderão ser evitadas e os
balanços terão de ser equilibrados.
O que é que provoca esta desordem
financeira?
No mês passado dei uma resposta curta :
“No
centro dos actuais problemas financeiros está o fracasso em adoptar
regulamentação financeira padrão para novas instituições financeiras, tais como
bancos correctores de investimento , hedge funds baseados off-shore e grandes mercados de derivativos que permanecem, na
maior parte, fora da autoridade tradicional dos reguladores. Contudo, quando as
coisas dão para o torto, como aconteceu com o Bear Stearns em Março último, sua morte ameaça
desestabilizar todo o sistema financeiro e apela-se rapidamente a convenientes
salvações governamentais.”
Hoje
afirmo que esta grande crise tem de ser colocada nos próprios pés do establishment de Washington
. Trata-se de um establishment político-financeiro que empurrou até aos limites
a sua ideologia de desregulamentação de mercados financeiros e esticou o
funcionamento do capitalismo corporativo de mercado
até ao ponto de ruptura. Agora o sistema está a implodir sob os nossos olhos e
as instituições financeiras caem como dominós. Como escrevi em Agosto último, e
repeti em Abril deste ano , o problema
financeiro dos EUA não é de liquidez (há muitíssima liquidez fornecida pelo Fed
quando bancos e correctores podem tomar emprestado à vontade dólares recém
impressos no guichet de desconto do Fed) mas sim de solvência, de balanços
fracos, activos arriscados e liquidação de divida. Trata-se de um cavalo de uma
outra cor.
Ao
longo dos últimos 25 anos, principiando com a administração Reagan e culminando
com a actual administração Bush-Cheney, o establishment de Washington
desmantelou peça por peça o sistema de protecção que fora construído a partir da
depressão económica da
década de 1930 e removeu praticamente todos os regulamentos federais que podiam
constituir obstáculo à cobiça e burla da parte de operadores de mercado
inescrupulosos.
E
eis que chega o momento da verdade. Fora das bancarrotas está a nacionalização
pelo governo dos bancos super-alavancados. E a administração Bush-Cheney deu um
grande passo nessa direcção quando veio resgatar as duas maiores instituições
de finanças hipotecárias, a Fannie Mae (Federal National Mortgage Association:
FNM) e o Freddie Mac (Federal Home Loan Mortgage Corporation, FRE) que iam
fechar por estarem insolventes. Este passo foi iniciado depois de bancos
centrais (na China, Japão, Europa, Médio Oriente e Rússia) ameaçarem parar de
comprar títulos e debentures emitidos pelas duas tremelicantes instituições
financeiras.
Mas
a administração Bush-Cheney, ainda que proporcionando dinheiro público para
manter os dois prestamistas em operação, parou um pouco antes das suas
nacionalizações. Na verdade, o governo dos EUA comprometeu-se a investir até
US$200 mil milhões em acções preferenciais e crédito estendido até 2009, a fim
de manter os dois prestamistas hipotecários solventes e em operação.
Mas
ao invés de tomá-los colocando-os em concordata (receivership) administrativa, a fim de
mudar o seu modelo de negócio, como ambos deveriam ter feito uma vez que o
governo agora está a garantir suas dívidas pendentes (mais de US$5 milhões de
milhões), o governo estado-unidense preferiu ao invés disso manter a aparência
de que estes bancos ainda estavam sob administração privada e apenas nomeara um
conservador legal para a Fannie Mae e o
Freddie Mac. Mesmo quando eles salvam duas das chamadas empresas patrocinadas pelo governo
(Government
sponsored enterprises, GSEs), a sua ideologia de mercado impede-os de fazer
a coisa correcta.
Após
anos de irresponsável desregulamentação pública e de malversão privada e
irresponsável, agravando o risco assumido, o sistema financeiro americano está
agora em séria perturbação, e ele pode puxar a economia dos EUA ainda mais para
baixo nos próximos meses e anos.
Nas
próximas semanas, contudo, quando outras instituições financeiras cambaleiam à
beira da bancarrota, o governo dos EUA terá de considerar a criação de um Bank Resolution
Trust de acordo com o modelo da Resolution Trust Corp. de
1989 a qual tomou as poupanças e empréstimos de bancos que estavam então em
dificuldades financeiras. Exemplo: ainda recentemente, em 16 de Fevereiro deste
ano, o governo britânico não hesitou em nacionalizar o Northern Rock e salvou
este grande banco britânico com cerca de £55 mil milhões (US$107 mil milhões)
em empréstimos públicos e garantias. Mais cedo ou mais tarde, o governo
americano terá de fazer o mesmo, a fim de estabilizar o sistema financeiro,
porque os problemas financeiros nos EUA são sistémicos e muito mais sérios do
que em outros lugares.
Da
mesma maneira, talvez o governo estado-unidense deva corrigir uma anomalia do
século XX, que é o status semi-privado do seu banco central. Na verdade, o Federal Reserve americano
é uma organização de banco central semi-pública e semi-privada que é em igual
medida responsável tanto para com grandes bancos privado como para com o
governo dos EUA e a população. Isto cria um conflito não saudável de interesses
que não é justo para o público americano. Na verdade, a prática americana de
privatizar lucros e socializar perdas seria considerada inaceitável na maior
parte das outras democracias.
O
que estamos a testemunhar nestes dias nos EUA é uma transferência maciça de
riqueza dos contribuintes, poupadores e aposentados para os bancos, seus
credores e seus administradores. Por um lado, o Fed enterrou profundamente as
taxas de juro reais no território negativo a fim de ajudar bancos perturbados
e, por outro, os contribuintes americanos tem financiado a salvação de
instituições financeiras muito grandes.
Pergunto-me
o que os dois campos presidenciais, o de Obama e o de McCain, têm a dizer
acerca disso! Ambos querem aumentar o défice federal e aumentar
significativamente a já elevada dívida nacional.
17/Setembro/2008
__________________________________________________
[1]
Margin calls: Pedido de fundos adicionais devido a movimentos de preços
adversos.
[*]
Professor emérito de Ciências Económicas na Universidade de Montreal, autor The
Code for Global Ethics . Email: rodrigue.tremblay@yahoo.com
O
original encontra-se em http://www.thenewamericanempire.com/blog
Este
artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
3.
22/Fevereiro/2008
O
sistema financeiro dos EUA, a bolha da dívida e o cancro da desregulamentação
excessiva
por Rodrigue Tremblay [*]
"É justiça poética que as pessoas que fermentaram esta
mixórdia tóxica porfim acabaram por beber um bocado dela".
Warren Buffett, investidor americano
"Através de um contínuo processo de inflação o governo pode
confiscar, secreta e anonimamente, uma parte importante da riqueza dos seus
cidadãos".
John Maynard Keynes (1883-1946)
"O novo dinheiro que entra na economia não afecta todos os
actores económicos por igual nem influencia todos os actores e económicos ao
mesmo tempo. O dinheiro recém criado deve entrar na economia num ponto
específico. Geralmente esta injecção monetária chega através da expansão do
crédito pelo sector bancário. Aqueles que recebem este novo dinheiro em
primeiro lugar beneficiam-se a expensas daqueles que o recebem só depois de ele
ter serpenteado através da economia e de os preços terem tido oportunidade de
ajustar-se".
Friedrich A. Hayek (1899-1992), economista austríaco
Quando o presidente do Fed, Ben
Bernanke , diz que a situação económica está a pior, é melhor que acredite
nele. De facto, os mercados de crédito nos EUA estão a entrar em colapso
debaixo dos nossos olhos, e não se vê quando isto acabará, muito menos de
quando reverterá.
1- Os principais indicadores económicos
da economia dos EUA estão em queda;
2- O sentimento de confiança do consumidor
está em queda quando as retiradas sobre hipotecas estão a secar;
3- Os números do emprego
estão em queda;
4- O relatório de Janeiro de 2008 sobre a economia
de serviços dos EUA indica que a mesma contraiu-se no
princípio do ano pela primeira vez em 58 meses;
5- O número de novos desempregados
ainda é perigosamente elevado;
6- A crise habitacional
está a ganhar vapor; os banco têm de colocar nos seus balanços perdas cada vez
mais elevadas devido às subprimes, minando portanto as suas bases de capital e
conduzindo muitos deles à beira da insolvência;
7- As agências de classificação de crédito
estão sob sítio;
8- Os títulos de companhias de garantia de seguros estão em vias
de perderem as suas classificações triplo A e algumas estão à beira da
bancarrota;
9- O mercado de títulos municipais
, com US$2,6 milhões de milhões (trillion) está prestes a mergulhar, se e
quando os seguradores de títulos não os arrastarem;
10- O mercado corporativo dos empréstimos alavancados (leveraged) está
desbaratado;
11- O mercado de mais de um milhão de milhões de dólares de hipotecas
e títulos apoiados em dívidas pode entrar em colapso
completo se os maiores segurados de hipotecas estado-unidenses continuarem a
sofrer perdas lancinantes;
12- Grandes hedge funds estão a perder
dinheiro numa escala elevada e estão a sofrer uma corrida sobre os seus
activos;
13- Nos EUA, a dívida total em percentagem
do PIB é superior a 300 por cento, um nível récorde (N.B.: em 1980 era
125 por cento!);
14- E, finalmente, o mercado à escala mundial de centenas de
milhões de milhões (trillion) de dólares em derivativos
poderia implodir a qualquer momento, se demasiadas instituições financeiras
forem abaixo durante os próximos meses, pois a maior parte destas transacções
são negócios inter-instituição.
Há uns poucos positivos desgarrados, tal como o facto de que o produto
manufactureiro parecer estar a levantar-se muito bem, pois o
dólar desvalorizado estimula as exportações, mas o quadro económico global
permanece negro. Isto é uma homenagem à capacidade de resistência da economia
dos EUA.
Toda esta confusão começou no princípio dos anos 2000, e mesmo
muito antes no principio dos anos 1980 quando Fed e a SEC adoptaram uma
abordagem de não tocar nos mercados financeiros, guiados pela nova religião
económica de que "os mercados não podem errar". O que estamos a
testemunhar é o fracasso de aproximadamente trinta anos das chamadas políticas
económicas conservadoras a cavaleiro da dívida e da desregulamentação.
Deve-se entender que o recente problema da subprimes
começou realmente em 2000, quando a agência de classificação de crédito
Standard & Poors emitiu um pronunciamento a dizer que o financiamento
hipotecário de casas "montado nas costas" ("piggyback"), quando uma
segunda hipoteca é tomada para pagar a entrada de uma primeira hipoteca,
provavelmente não conduziria a mais incumprimentos do que mais hipotecas
padrão. Isto encorajou instituições de empréstimos hipotecários a relaxarem as
suas práticas de empréstimos, indo tão longe como emprestar sobre hipotecas com
nenhum pagamento inicial de qualquer espécie, e até mesmo adiar pagamentos de
capital e juros por algum tempo. E com o Fed e a SEC a olharem para o outro
lado, foi dado um passo fatal. Os bancos e as suas subsidiárias decidiram
seguir novas regras tóxicas e arriscadas de operação bancária.
Na verdade, apesar de os bancos tradicionalmente tomarem
emprestado a curto prazo e concederem empréstimos a longo, eles deram um novo
passo gigantesco: começaram a transformar empréstimos a longo prazo, tais como
hipotecas, empréstimos para carros, estudantes, etc em empréstimos a curto
prazo. Realmente, eles caíram no negócio do alquimista de entrouxar juntos
empréstimos a prazos relativamente longos dentro de pacotes que cortaram às
fatias dentro de instrumentos de crédito mais pequenos que tinham todas as características
de papel comercial a curto prazo, mas estavam a carregar rendimentos mais
elevados. Eles então venderam estes novos structured investment
vehicles (SIVs), por uma comissão, a toda espécie de investidores que
estavam à procura de rendimentos mais altos do que as magras taxas que estavam
a pagar as alternativas. E, uma vez que os bancos estavam por trás destes novos
activos financeiros, as agência de créditos deram-lhes uma classificação AAA, o
que permitiu aos fundos de pensão regulados e às companhias de seguros
investirem neles, acreditando que eram tanto seguros como líquidos. Ficaram
prontos para um choque. Quando a bolha imobiliária explodiu, o valor dos
activos reais por trás dos novos instrumentos financeiros começou a declinar,
puxando o tapete para fora dos asset-backed paper market
(ABCP) que estavam por baixo, os quais tornaram-se ilíquidos e tóxicos. Como
praticamente não há qualquer comercialização com os novos instrumentos, ninguém
sabia o verdadeiro valor do papel, e portanto ninguém e estava desejoso de
comprá-lo. Esta crise de confiança agora permeou outros mercados de crédito e
está a ameaçar todo o sistema financeiro à medida que o contágio se propaga.
Ainda em 2003-04, o então presidente do Fed, Alan Greenspan, não
era o menos preocupado com a bolha da hipoteca imobiliária financiada pela
subprime mas estava ao contrário a encorajar pessoas a sacarem hipotecas com
taxa ajustável, apesar de as taxas de juro estarem numa baixa de trinta anos e
estarem prestes a aumentar. Mesmo no fim de 2006, o recém nomeado presidente do
Fed, Ben Bernanke, manifestou não estar preocupado com a bolha imobiliária,
dizendo que preços elevados eram apenas um reflexo de uma economia forte. Note
bem, isto aconteceu mais de um ano depois de o mercado imobiliário ter atingido
o pico, no Verão de 2005. A história registará que o Fed e a SEC nada fizeram
para prevenir a pirâmide da dívida de atingir os níveis perigosos a que chegou
e que está agora a esmagar a economia.
Num espaço de tempo mais longo, quando se olha o gráfico fornecido
pelo Bureau of Economic Analysis (BEA) dos EUA que mostra a importância
das dívidas pendentes (corporativas, financeiras, governamentais e
mais as pessoais) em relação à economia, fica-se impressionado pelo facto de
que este rácio permaneceu em torno dos 1,2 do PIB durante décadas. Então,
alguma coisa grande aconteceu no princípio da década de 1980, e o rácio começou
a ascender, apenas com uma ligeira pausa nos meados da década de 1990, até
atingir o actual nível com falta de ar de 3,1 vezes do PIB, aproximadamente 200
por cento mais do que costumava ser.
A adopção de cortes fiscais maciços
a par com políticas de gastos deficitários do governo, e políticas de
desregulamentação, por parte de Reagan
e subsequentes administrações republicanas, culminando tudo num modo grotesco
sob a actual administração, contribuiu maciçamente para esta bolha
da dívida sem precedentes. Levou muitos anos para construir a pirâmide da
dívida, e levará muitos anos para desfazê-la e reduzir esta montanha acumulada
de dívida a uma dimensão mais administrável.
Este é o grande quadro por trás desta crise. Ela é muito maior do
que a crise das caixas económicas (S&L) na década de 1980, a qual parece
diminuta em comparação com a actual. Eis porque penso que esta crise
prolongar-se-á pelo menos mais uns poucos anos, possivelmente até 2010-11.
_______________
22/Fevereiro/2008
[*] Professor emérito de Teoria Económica na Universidade de Montreal.
Autor de The New American Empire e
de The
Code for Global Ethics (ainda não lançado). Responsável pelo sítio web
www.thenewamericanempire.com/
e pelo blog www.thenewamericanempire.com/blog
. Contacto: rodrigue.tremblay@yahoo.com
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
.
2.
21
setembro 2007
Um
pânico do Federal Reserve e uma operação maciça de salvamento de bancos
americanos paga pelo mundo inteiro
por Rodrigue Tremblay [*]
"As loucuras, os pânicos e as quedas das bolsas são
consequência de uma economia que cultiva a cupidez, a conspiração e a ganância
em vez de uma fé devota na Regra de Ouro".
Peter L. Bernstein, Foreword to Manias, Panics, and Crashes (4th
ed.) by C. P. Kindleberger
"Numa crise, reduzam os preços e reduzam-nos
fortemente".
Walter Bagehot (1826-1877), economista britânico
"O papel da Reserva Federal é esconder a taça do ponche logo
que a festa começa a ficar animada".
William McChesney Martin (1906-1998), Presidente do Fed
(1951-1970)
"O estado da disfuncional política americana não me dá grande
confiança no futuro próximo".
Alan Greenspan, Presidente do Fed (1987-2006)
A má gestão do dinheiro e do crédito sempre levou a explosões
financeiras ao longo dos séculos. As causas, curas e consequências dessas
catástrofes financeiras são quase sempre repetitivas. Com efeito, esses
colapsos financeiros são normalmente resultado da avidez e da ganância
desenfreada dos operadores financeiros e da falta da indispensável supervisão
pelas instituições oficiais que deviam proteger os bens públicos e comuns. Por
exemplo, depois da crise financeira de Outubro/Novembro de 1907 nos Estados
Unidos, acabou por ser aceite em 1913 a ideia avançada inicialmente pelo
banqueiro Paul Warburg para instituição de um sistema bancário da Reserva
Federal (Fed) em parte privado e em parte público. O Fed tornou-se assim o
prestamista de último recurso para os bancos que chegam a uma posição de perda
de liquidez. Mas foi só depois da queda da bolsa de 1929 é que foi fundada a
Security and Exchange Commission (SEC).
Mas mesmos com instituições e regulamentações estabelecidas, se
elas forem inoperantes, corruptas ou desadaptadas, podem continuar a ocorrer crises
financeiras. E a actual crise financeira aí está para nos recordar esse facto.
Em 18 de Setembro (2007), o Fed demonstrou algum pânico e anunciou
o corte de meio ponto percentual, mais do que era esperado, na taxa de fundos
federais e na taxa de desconto, isto depois de ter reduzido a taxa de desconto
de meio ponto, em 17 de Agosto, a fim de facilitar que os maiores bancos da
América contraíssem empréstimos e a fim de facilitar uma operação de salvamento
das suas afiliadas e de outros operadores, tais como os hedge-funds [1]
, apanhados pela crise dos empréstimos secundários. Com esta atitude, o Fed de
Bernanke [2] está a seguir o conselho de Bagehot para uma
agressiva redução de preços em situação de crise financeira. Só que o problema
é que a regra de Bahegot exige que o banco central faça abundantes empréstimos
em tempos de escassez crítica de créditos… mas com uma taxa de juros alta. Ao
emprestar a prestamistas em dificuldade a taxas preferenciais reduzidas, o Fed
está a agir como "governo" deles, isto é, a subsidiar as suas
arriscadas operações de empréstimos e a carregar de impostos apenas os que
possuem dólares americanos. Não está a tentar apenas torná-los mais
"líquidos", mas também mais "resolúveis" e com menos
probabilidades de falir.
Isto coloca três questões interessantes. Primeira, quem paga a
operação de salvamento das instituições financeiras americanas; segunda, quais
são as consequências a longo prazo da maciça operação de salvamento empreendida
pelo Fed; e terceira, porque é que o Fed deixou que a situação financeira se
deteriorasse a um ponto tal que há um sector inteiro da economia que se está a
desmoronar e o seu colapso ameaça toda a economia.
Em primeiro lugar, temos que considerar que o dólar americano ainda
continua a ser uma divisa de reserva chave, embora esteja a perder terreno para
o euro, e a maior parte dos bancos centrais ainda continua a mantê-lo em
quantidades enormes nas suas reservas de divisas estrangeiras, tal como
acontece com bancos privados, entidades comerciais e económicas e pessoas por
todo o mundo. Por exemplo, no início de 2007, os bancos centrais estrangeiros,
só por si, detinham cerca de 2 250 milhares de milhões de reservas em dólares
americanos, o que representava cerca de 66 por cento das suas reservas oficiais
totais de divisas estrangeiras, ao lado de um pouco mais de 25 por cento de
reservas em euros.
Como o dólar está a perder o seu poder de compra, tanto em termos
absolutos como relativos, os bancos centrais e outros investidores estrangeiros
têm vindo a ser "colectados" pela política de pouca preocupação com o
dólar do Fed americano. Em termos reais, pode medir-se o imposto de seigneurage [3]
sobre os possuidores estrangeiros de dólares calculando a diferença entre a taxa
anual da depreciação do dólar vis-à-vis as principais divisas convertíveis e a
taxa de juro a curto prazo sobre essas reservas. Por exemplo, se a taxa anual
de depreciação do dólar é de cinco por cento e a taxa a curto prazo do retorno
dos títulos de tesouro americano é de quatro por cento, os bancos centrais
estão a perder cerca de 22,5 mil milhões de dólares por ano. Como os
estrangeiros privados detêm uma dívida de mais de 2 milhões de milhões de
dólares, a perda líquida anual dos possuidores estrangeiros de dólares
americanos pode atingir facilmente os 50 mil milhões de dólares por ano. A
conclusão é fácil de tirar: Não só os estrangeiros têm vindo a financiar
fortemente os enormes défices do governo dos EUA nos últimos seis anos, como
estão agora a impor-lhes que ajudem a financiar a generosa operação de
salvamento das instituições financeiras americanas.
Os investidores, tanto no estrangeiro como nos EUA, sabem que,
para muita gente, os números oficiais da inflação estão subestimados,
essencialmente porque com isso pretende-se reduzir o peso dado nos indicadores
aos bens e serviços cujos preços aumentam mais rapidamente, mas também porque
os custos da habitação e os preços das propriedades só são tidos em
consideração parcialmente. Isto pode explicar porque é que as expectativas de
inflação apontam para uma subida, apesar de os números oficiais da mesma não
apresentarem uma subida. Há dinheiro fácil a mais conforme se viu nos últimos
anos aquando da primeira inflação dos produtos petrolíferos, mas mais tarde ou
mais cedo surge a subida dos preços de todas as mercadorias e dos preços de
todos os bens e serviços. Com a actual queda do dólar, é de esperar que os
americanos venham a pagar mais por uma série de artigos, tais como o
combustível e a alimentação. Isso traduzir-se-á num padrão de vida mais baixo.
O preço do ouro, o preço do petróleo e os preços de outras
mercadorias estão a subir e podem servir de campainhas de alarme da inflação. O
comportamento das taxas de juro a longo prazo que incorporam expectativas de
inflação é também um bom indicador da futura inflação. Com o Fed a imprimir
dinheiro e a aumentar a disponibilidade de dinheiro a alta escala, como se
estivesse a ser lançado do céu por um helicóptero (daí a alcunha de
"Helicóptero" para Ben Bernanke, presidente do Fed), as taxas de juro
a curto prazo irão cair durante algum tempo, mas as taxas de juro a longo prazo
terão tendência a subir lentamente, a não ser que se desencadeie uma profunda
recessão.
Em segundo lugar, uma maciça operação de salvamento tal como o Fed
de Bernanke desencadeou coloca a questão do risco moral presente em qualquer
operação desse tipo feita pelo banco central, depois de não ter conseguido
regular devidamente as actividades de risco dos bancos que supervisiona. Na
verdade, ao aceitar acções e obrigações sustentadas por hipotecas como garantia
para gigantescos empréstimos a prazo mais ou menos longo, empréstimos esses
contraídos pelos bancos e corretores americanos, o Fed está mas é a recompensar
as próprias instituições que agiram de forma extremamente irresponsável durante
os últimos quatro a cinco anos, enquanto limpa a sua própria imagem por ter
fracassado na sua missão reguladora. A mensagem é muito clara: As instituições
financeiras americanas podem entregar-se à criação de instrumentos
"inovadores" de crédito artificial de alto risco, atirando os riscos
para cima de mutuários e investidores inocentes e arrecadando comissões e
prémios chorudos, e quando as coisas dão para o torto, como é de esperar,
aparece o Fed em seu socorro e salva-os com empréstimos baratos e prolongados.
É uma boa forma de encorajar descuidadamente qualquer instituição financeira
gananciosa e fora de controlo a fomentar sucessivas crises financeiras
desordenadamente e de forma perturbadora.
Na verdade, o Fed de Bernanke está agora a livrar da dor das
consequências as instituições financeiras que agiram irresponsavelmente,
algumas delas que agiram mesmo criminosamente, conforme disse Alan Greenspan,
antigo presidente do Fed. É um caso evidente de risco moral.
Se não forem implementados novos regulamentos ou se não forem
postos em marcha novos regulamentos, uma operação maciça como esta assegura que
as instituições financeiras americanas vão continuar no futuro a tentar ganhar
dólares rápidos criando capital artificial de risco, sem pesar devidamente os
riscos envolvidos para os pequenos investidores e pequenas poupanças, enquanto
que o Fed assumirá a responsabilidade de desviar as perdas em parte para si
próprio mas principalmente para os possuidores de dólares americanos. Com
efeito, o Fed está a manter em suspenso a disciplina de mercado a favor dos
grandes jogadores financeiros que coloca sob sua protecção, enquanto deixa que
a disciplina de mercado esmague os pequenos proprietários de habitações e os
pequenos investidores que compraram casas, agora com hipotecas instáveis, ou
que investiram as suas poupanças em títulos de dívida com garantias
fraudulentas e de alto risco (CDO's). É este o resultado líquido da aplicação
parcial da regra de Bagehot.
A terceira questão é: porque é que o Fed de Greenspan e de
Bernanke não escondeu mais cedo a taça de ponche do dinheiro fácil e do crédito
fácil, quando as coisas começaram a ficar feias no mercado de hipotecas
secundárias durante o período de 2003-2007. Porque é que parecia paralisado e
nada fez? O antigo presidente do Fed, Alan Greenspan, tem uma explicação
simples e conveniente. Antes de 2003, receou um início da deflação e foi por
isso que o Fed elevou a sua taxa principal de empréstimo de 1 por cento (de
Junho de 2003 a Junho de 2004) apenas pela segunda vez na história. Também
afirma que havia demasiadas "poupanças globais" pelo mundo afora e
que foi isso que fez descer as taxas de juro. Isto é uma explicação deslavada,
porque, se a globalização e as poupanças globais mantiveram a inflação baixa e
as taxas de juro a prazo baixas, a subida das taxas de juro a curto prazo e o
aumento do fornecimento de moeda estiveram sempre sob o controlo do Fed. O Fed
não tinha obrigação, depois de 2003, de manter as taxas de juro a curto prazo
tão negativas durante tanto tempo. Claro que, como a administração Bush andava
a cortar as taxas dos impostos para reforçar as perspectivas de reeleição em
2004, e andava a gastar dinheiro à maluca em guerras travadas em terras
distantes, o Fed devia ter percorrido a via contrária para contrabalançar o
ímpeto fiscal que isso criava para a macro economia. Por outras palavras, devia
ter escondido a taça do ponche. Mas não o fez.
Em consequência, a dívida hipotecária como percentagem da renda
disponível nos EUA encontra-se ao nível mais alto dos últimos setenta e cinco
anos, atingindo 100 por cento, enquanto que a dívida de consumo subiu para o
nível mais alto da história. Tudo isto torna a economia mais vulnerável do que
nunca desde a depressão de 1929-39. Outra consequência desta farra de dinheiro
fácil é o frenesi de leveraged buy-outs [4] e a concentração
industrial que temos vindo a observar nos últimos anos.
Por fim, ponhamos a cereja em cima do bolo. Com efeito, há um
trecho muito inquietante no recente livro de memórias (The Age of Turbulence) do antigo
presidente do Fed, Alan Greenspan, e nas explicações que ele deu em entrevistas
concedidas para divulgação do livro: é a sua confissão de que, enquanto desempenhou
o cargo de presidente do Fed, incitou activamente o vice-presidente Dick Cheney
para um ataque dos EUA ao Iraque. Se isto aconteceu, foi muito incorrecto que
um banqueiro central agisse desta forma, principalmente quando tinha mais que
fazer do que pressionar a favor de uma guerra ilegal. Quer isto dizer que
Greenspan foi um membro activo do grupo de pressão pró Israel no interior do
governo dos EUA e se juntou à quadrilha de
Wolfowitz-Feith-Abrams-Perle-Kissinger? Parece-me que uma atitude destas devia
ser objecto de investigação.
Na verdade, até que ponto é que o grupo de pressão pró Israel foi
responsável pela guerra do Iraque e pelos défices que ela gerou? Já existem
neste momento sondagens que indicam que 40 por cento dos eleitores americanos
acreditam que o grupo de pressão pró Israel foi um factor chave na entrada da
guerra com o Iraque e que o mesmo está de novo muito activo na promoção de uma
nova guerra contra o Irão. Este número tende a aumentar à medida que cada vez
há mais pessoas a perceber os factos que estão por detrás desta guerra tão
desastrosa e mal concebida. Com efeito, quantas guerras é que este grupo pode
engendrar antes de ser detido? E até que ponto o turbilhão financeiro nos EUA e
nos mercados mundiais pode vir a ser relacionado com a influência deste grupo
tão corrosivo?
21/Setembro/2007
__________________________________
Notas
(1) hedge-funds – fundos que investem no comércio a prazo de
mercadorias visando diminuir os riscos e reduzir os prejuízos (N.T.)
(2) Bernanke – Ben Shalom Bernanke é um economista, presidente do
Conselho de Governadores da Reserva Federal dos Estados Unidos (N.T.)
(3) seigneurage – receita líquida decorrente da emissão de
divisas. É uma importante fonte de receita para os bancos nacionais (N.T.)
(4) leveraged buy-out – aquisição da totalidade ou da maioria das
acções de uma empresa com recurso a capitais de empréstimo (N.T.)
_____________________________________________
[*] Economista canadiano, colaborador frequente de Global
Research, autor de The New American Empire . O seu próximo livro intitula-se
"The Code for Global Ethics".
O seu blog: www.thenewamericanempire.com/blog
O original encontra-se em http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=6832
.
Tradução de Margarida Ferreira.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
.
25/Set/07
Postado
por gilberto tedeia às Quarta-feira, Setembro 26, 2007
1.
O complexo industrial militar dos EUA
29-09-2006
[Online
Journal. Traducido do inglés para Rebelión por Sinfo Fernández. Ao
galego por altermundo.org]
Os
cinco alicerces do complexo industrial militar dos Estados Unidos.
“Pódense atopar sistemas militares desmesurados
en calquera modalidade de goberno que manteña actitudes de rexeitamento ante a
liberdade, e que son considerados particularmente hostís ante a liberdade
republicana”
George Washington (1732-1799). Primeiro
presidente estadounidense.
“[A] conxunción dun sistema militar inmenso e dunha
gran industria armamentística é algo novo na experiencia estadounidense… Nos
consellos de goberno, debemos gardarnos ben de que o complexo industrial
militar chegue a ter unha influencia inxustificábel, sexa ou non alentada. Hai
potencial, e seguirá habéndoo, para que se produza ese desastroso aumento de
poder de xeito evidente inapropiado.”
Dwight D. Eisenhower (1890-1969), 34º presidente, discurso de
despedida, 17 de xaneiro de 1961.
“Que o noso país vaia agora cara a un modelo de
economía baseada nas armas é parte do modelo xeral dunha política desacertada,
alimentado con axuda dunha psicosis, inducida artificialmente, de histeria de
guerra e nutrida a partir dunha propaganda incesante ao redor do medo.”
Xeral Douglas MacArthur, discurso do 15 de maio
de 1951.
Na década
dos anos vinte do pasado século, o Presidente Calvin Coolidge dixo: “O negocio
de EUA consiste en facer negocios”. Na actualidade, pode dicirse que a
industria de armas e a guerra permanente convertéronse nunha gran parte do
negocio estadounidense, conformándose como unha especie de filial dun complexo
industrial militar ben arraigado. Anteriores homes estadounidenses con visión
de alcance fixeron advertencias contra esta deriva, homes como o Presidente
George Washington e o Presidente Dwight Eisenhower, ao ser intrinsicamente
contraposta á democracia e á liberdade. Con todo, á actual administración
Bush-Cheney non lle asustan esas tendencias; os seus principais membros son
parte delas e, precisamente, están moi ocupados promocionándoas.
As guerras, especialmente as guerras electrónicas modernas,
provocan uns masacres terríbeis, pero son tamén sinónimo de grandes contratos
que supoñen custes altísimos, grandes beneficios e grandes posibilidades de
emprego para todos aqueles que conforman o necesario engranaxe militar. As
guerras son o paraíso dos preeiros.
As guerras son tamén unha vía para que políticos mediocres
monopolicen as novas e os medios de comunicación no seu favor de xeiro
partisano avivando o fervor patriótico e presionando por un nacionalismo de vía
estreita. Efectivamente, inflamar o patriotismo e o nacionalismo é un vello
truco demagógico que se utilizou sempre para dominar as nacións. Cando iso
sucede, hai un claro risco de que a democracia e a liberdade se erosionen, e
ata que desaparezan se eses desenvolvementos conducen a unha concentración
exacerbada de poder e de corrupción política.
Os ataques terroristas do 11-S de 2001 supuxeron unha bonanza para
o complexo industrial militar estadounidense. Foi un acontecemento, un “Novo
Pearl Harbor”, polo que algúns estiveran esperando. A razón? Eses ataques deron
o pretexto perfecto para desenvolver gastos militares, que se anhelaban logo da
desaparición do antigo Imperio Soviético. E, ademais, proporcionaron o
fundamento para aumentalos de xeito espectacular, substituíndo unha “Guerra
contra o Terrorismo” por unha “Guerra contra os Islamistas” como substituta da
“Guerra contra o Comunismo” e a “Guerra Fría contra a Unión Soviética”. Nesta
nova perspectiva, as portas do gasto militar podían abrirse e este fluír de
novo. O desenvolvemento do cada vez máis sofisticado armamento podería
continuar e miles de corporacións e centos de distritos políticos poderían
seguir levándose os beneficios. Os custes serían asumidos polos contrinuíntes,
polos homes e mulleres novas que morrerían en combate e polas remotas
poboacións que xacerían baixo a choiva de bombas que caerían sobre eles e os
seus fogares.
Efectivamente, en setembro de 2000, cando o Pentágono emitiu o seu
famoso documento estratéxico titulado “Reconstruíndo as Defensas dos EUA”,
expresábase a crenza en que o tipo de transformación militar que os
planificadores estaban a considerar requeriría dalgún “suceso catastrófico e
catalizador”, como un novo Pearl Harbor, para que fora posíbel venderlle o plan
ao pobo estadounidense. Foron ou intuitivos ou afortunados porque, un ano máis
tarde, xa tiñan o “Novo Pearl Harbor” polo que devecían.
O complexo industrial militar necesita guerras, moitas e sucesivas
guerras, para prosperar. O equipamiento militar vello ten que ser reparado e
reemplazado cada determinado tempo se hai unha guerra en marcha. Pero para
xustificar o enorme custe que supón ter que desenvolver armas cada vez máis
mortíferas, necesítase que haxa un clima constante de temor e vulnerabilidade.
Por exemplo, hai moitos informes, elaborados por observadores internacionais e
persoal médico, no senso de que os ataques israelís contra o Líbano e Gaza
durante o verán de 2006 facilitaron o uso de “novas armas feitas nos EUA”.
Informouse que esas armas incluían bombas de uranio empobrecido, armas de
“enerxía directa” e armas novas químicas e biolóxicas. Estas armas non só
logran que o acto de matar sexa máis doado, senón que tamén deixarán
contaminado o medio ambiente con partículas de uranio empobrecido radioactivo
durante as próximas décadas.
Pero, para construír un pacto suficientemente forte como para
levar a un país democrático polo carreiro dunha permanente economía de guerra,
necesítase unha alianza de intereses entre militaristas, industriais,
políticos, aduladores e propagandistas. Estes son os cinco alicerces do
complexo industrial militar que poden atoparse nos Estados Unidos.
1. O sistema militar estadounidense
En 1991, ao final da Guerra Fría, o orzamento de defensa dos EUA
era de 298.900 millóns de dólares. En 2006, ese orzamento medrara ata acadar a
cifra de 447.400 millóns de dólares, e esa cifra non incluía os 100.000 millóns
de máis gastados nas guerras de Iraq e Afganistán. Estimouse que os gastos
militares estadounidenses, sen necesidade de esaxerar, achéganse á metade dos
desembolsos militares mundiais (48% do total mundial en 2005, segundo cifras
oficiais), malia que a poboación estadounidense representa menos do 5% da
poboación mundial e ao redor do 25% da produción mundial total. Como
porcentaxe, os gastos militares estadounidenses comen un mínimo do 21% do
orzamento federal total estadounidense (2006=2.500 billóns de dólares). Un
orzamento militar tal é maior que o productor interior bruto (PIB) dalgúns
países, como Bélxica ou Suecia. É unha especie de goberno dentro doutro
goberno.
En 2006, o Departamento de Defensa dos EUA empregou a 2.143.000
persoas, mentres que os contratistas de defensa privada empregan a 3.600.000
traballadores, o que supón un total de 5.743.000 postos de traballo nos EUA
relacionados co sector da defensa, ou o 3,8% do total da forza laboral.
Ademais, hai case 25 millóns de veteranos nos EUA. Xa que logo, pódese dicir
que máis de 30 millóns de estadounidenses reciben cheques que teñen a súa orixe
directa ou indirectamente no orzamento militar do estado. Supoñendo con cautela
que só dúas persoas maiores de idade votan por fogar, isto tradúcese nun bloque
duns 60 millóns de votantes estadounidenses que teñen intereses financeiros no
sistema militar estadounidense. Así pois, atopámosnos co perigo dunha sociedade
militarizada que se perpetúa a si mesma politicamente.
2. Os contratistas da defensa privada
Os cinco contratistas máis importantes da Defensa estadounidense son
Lockheed Martin, Boeing, Northrop Grumman, Raytheon e General Dynamics. Van
seguidos de Honeywell, Halliburton, BAE System e miles de compañías e
subcontratas de defensa máis pequenas. Algunhas, como Lockeheed Martin en
Bethesda (Maryland) e Raytheon en Waltham (Massachussets) obteñen preto do 100%
dos seus negocios dos contratos de defensa. Outras, como Honeywell en
Morristown (Nova Jersey), teñen importantes divisións de produtos de consumo.
Con todo, todas están preparadas para sacar proveito en canto os gastos de
subministros de armas medran. De feito, os contratistas de defensa
estadounidenses estiveron gozando dos grandes orzamentos do Pentágono dende
marzo de 2003, i.e., dende o comezo da guerra de Iraq. Como consecuencia,
contabilizaron aumentos considerábeis nos rendementos totais das súas accións,
indo dende o 68% (Northrop Grumman) ata o 164% (General Dynamics) dende marzo
de 2006 a setembro de 2006.
Tamén se sinalou que os contratistas da defensa privada xogan
outro papel social: son grandes empregadores de antigos xenerais e antigos
almirantes do sistema militar estadounidense.
3. O sistema político
Nos EUA, o Presidente George W. Bush, un antigo petroleiro, e o
Vicepresidente Dick Cheney, como antigo presidente e director executivo da gran
compañía de servizos petrolíferos Halliburton, en Houston (Texas), personifican
a imaxe de políticos consagrados ao crecemento e desenvolvemento do complexo
industrial militar. A súa administración estendeu o sistema militar e adoptou
unha política exterior militarista a unha escala nunca vista dende a fin da
Guerra Fría e ata dende a fin da II Guerra Mundial. Efectivamente, baixo a
administración Bush-Cheney, a industria armamentística volveuse extremadamente
rendíbel. Contratos por miles de millóns de dólares van a toda marcha vendendo
avións e tanques a diversos países nun mundo que evoluciona cada vez máis de
costas ao dereito. Case as dúas terceiras partes de todas as armas exportadas
no mundo saen de Norteamérica.
O Congreso, pola súa banda, está en débeda coas corporacións de
defensa que operan nas plantas militares existentes é cada un dos distritos dos
congresistas ou nos estados dos senadores, ademais de certas gratitudes aos
lobbys que lles proporcionan fondos e apoios nos medios en épocas electorais.
4. Os “think tanks” do sistema
Os asesores e os aduladores que se achan detrás da economía
orientada cara a guerra forman un rede entrelazada dos chamados “think tanks”
con sé en Washington, financiados por ricas fundacións que están exentas de impostos
e que teñen miles de millóns de dólares de activos, como, por exemplo, a
Fundación John M. Olin, a Fundación Scaife ou a Fundación Coors, etc… Entre os
“think tanks” máis influíntes e representativos, cuxa misión é orientar a
política exterior estadounidense, atópase o American Enterprise Institute
(AEI), a Heritage Fundation, o Middle East Media Research Institute, o
neoconservador Washington Institute for Near Eastern Policy, o Center for
Security Policy, o Jewish Institute for National Security Affaire, o Project
for the New American Century (PNAC) e o Hudson Institute. Todos eses “think
tanks” serven para un dobre obxectivo: proporcionan funcionarios gobernamentais
para realizar informes políticos sobre diversos temas, normalmente cunha visión
moi conservadora; e serven como incubadoras dos departamentos gobernamentais,
fornecéndolles persoal que xa foi formado e proporcionando postos de traballo
para funcionarios que están fóra do poder.
Obsérvase que a mesma porta xiratoria que existe entre o sistema
militar e os contratistas de defensa, tamén se move entre os “think tank” con
sé en Washington e os departamentos do goberno dos EUA.
5. O establishment da “propaganda”
Os propagandistas da economía a favor da guerra pódense atopar
máis ca nada na dereitista industria dos medios de comunicación
estadounidenses. Isto débese a que a venda de políticas orientadas cara á
guerra require a pericia que só unha ben engrasada máquina de propaganda pode
proporcionar. A ferramenta propagandística máis potente é a televisión. Aí a
Rede Fox de Novas de Rupert Murdoch é invencíbel. Non hai un medio de
comunicación estadounidense máis abertamente devoto da ideoloxía neocon e máis
comprometido no apoio das novas guerras estadounidenses que a Fox News. A CNN ou a MSNBC poden
intentar algunhas veces emulala, pero o seu profesionalismo impídelles
achegarse de máis a Fox News, que está demasiado predisposta a favor da guerra e
promove sen pudor algún a dominación global dos EUA. Os esforzos de propaganda
da Fox están estreitamente coordinados con outro medio escrito propiedade de
Murdoch, como é o Weekly Standard e o New York Post. O Washington Times, que está
controlado polo Reverendo da Igrexa da Unificación Sun Myung Moon, o
neoconservador New
York Sun e outras publicacións neocon, como o National Review, The New Republic, The
American Spectator, The Wall Street Journal, completan a infraestrutura
máis importante de propagandistas a favor da guerra.
En conclusión, esa conxunción de cinco maquinarias para a guerra,
i.e., o inflado establishment militar, a gran industria armamentística
estadounidense, a administración neocon favorábel ás guerras, co Congreso de
xeonllos ante os lobbys militaristas, a rede de “think tanks” favorábeis á
guerra e os belicosos propagandistas dos medios constitúen o marco do complexo
industrial militar, do que o Presidente Dwight Eisenhower, en 1961, hai 45
anos, xa temía sabiamente que puidese exercer unha influencia corrosiva sobre a
sociedade estadounidense.
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*Rodrigue Tremblay é profesor emérito de
economía no Universidade de Montreal. rodrigue.tremblay@yahoo.com
É autor do libro The New American Empire.